sábado, 8 de novembro de 2014

Os ciclos biogeoquímicos e hidrológicos e os constituintes naturais das águas (Biogeochemical and hydrological cycles and the natural constituents of water)

Com o ciclo hidrológico, a água na natureza circula continuamente, sempre em fluxo por meio de evaporação, precipitação, escoamento superficial e escoamento subterrâneo. O ciclo hidrológico é acionado pelo calor da energia do Sol, o que contribui para que adquira ou perca impureza, sejam físicas, químicas ou biológicas.

Da quantidade total de água precipitada, 77% caem sobre os oceanos e 23% sobre as áreas emersas. Por outro lado, 84% da evaporação total da Terra provêm dos oceanos e as terras emersas contribuem com apenas 16%. De toda a água na Terra, 97% formam os oceanos e apenas 3% são encontrados nos continentes ou na atmosfera. Desse total, aproximadamente 75% formam as geleiras e 24,5% ocorrem como água subterrânea. Portanto, as águas dos rios, dos lagos (e lagoas) e da atmosfera perfazem apenas 0,5 a 3% (SUGUIO, 2006). Este ciclo pode explicar o motivo pelo qual não se pode dizer que a água está a acabar, mas as reservas disponíveis são, de fato, limitadas (UNDP, 2006).

Com a precipitação, além de abastecer o lençol freático, com a infiltração da água no solo, as plantas aproveitam para absorvê-la através de suas raízes; e, por escoamento superficial, as águas chegam às áreas mais baixas até alcançar lagos, lagoas, rios ou oceanos.

Água pura é um conceito limite. No sentido rigoroso do termo, não existe na natureza, pois, sendo a água um bom solvente nunca é encontrada em estado de absoluta pureza.

Um corpo d’água é um sistema dinâmico, continuamente recebendo uma variedade de materiais sólidos, líquidos e gasosos, bem como energia em diversas formas originárias de fontes que podem ser naturais ou decorrentes de atividades humanas (FAURY et al., 1984).

As características químicas das águas fluviais começam a ser compostas e definidas ainda no trajeto atmosférico. As partículas sólidas e gases atmosféricos como o oxigênio, o nitrogênio, o gás carbônico e outros gases de variadas origens (Quadro 1) são dissolvidos pelas águas que caem na superfície da Terra em suas várias formas.

Quadro 1 - Origens e associações dos componentes químicos na água de chuva. 
Origem
Associações
Mar
Cl – Na – Mg – SO4
Solos
Al – Fe – Si – Ca – (K, Mg, Na)
Biológica
NO3 – NH4 – SO4 – K
Queimadas
NO3 –NH4 – P – K – Ca – Na – Mg – SO4
Poluição industrial
SO4 – NO3 – Cl
Insumos agrícolas (fertilizantes)
K – PO4 – NH4 – NO3
Fonte: Berner e Berner (1987) apud Rebouças (2006).

Entre as substâncias químicas contidas nas águas continentais, além das provenientes da atmosfera, se tem as que foram dissolvidas das rochas e solos durante o período de precipitação pelo processo de intemperismo químico (Tabela 1).

Tabela 1 - Composição química média das águas fluviais do mundo (principais íons em mg/L).


 Fonte: Livgstone (1963) apud Suguio (2006).


As águas superficiais originadas pelas precipitações, cujas composições foram influenciadas pelos componentes atmosféricos, são relativamente ricas em sais minerais e matéria orgânica, e uma concentração de oxigênio próximo à sua saturação. Grande parte da precipitação escoa sobre a superfície do solo formando as correntes de água alimentando os rios com grandes volumes de escoamento superficial (deflúvio), trazendo consigo toda sorte de sedimentos: vegetações mortas, extratos orgânicos, microrganismos e solos.

As águas, ao caírem em coberturas florestais, em uma bacia hidrográfica, estas afetam a sua constituição de várias maneiras. A contínua absorção de nutrientes do solo pelas árvores e a devolução destes nutrientes pelo acúmulo e decomposição da serrapilheira devem, também, ser levados em conta como importantes fatores na variação temporária das concentrações de nutrientes no deflúvio. A concentração de nitratos, por exemplo, tende a aumentar durante a estação de dormência em bacias florestadas de climas temperados. Por outro lado, a queda direta de detritos vegetais na água, pode produzir alterações temporárias na qualidade e composição da água. Nas águas superficiais sempre é encontrado microrganismos trazidas do solo através do deflúvio ou já existente na própria água.  Dificilmente teremos pureza bacteriológica, embora a maioria das bactérias encontradas nas águas seja proveniente do solo e do próprio habitat aquático, isto, quando as atividades antrópicas não mudam este sistema (Figura 1).
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Figura 1. Ciclo hidrológico (movimentação de água) e biogeoquímico (elementos químicos e biológicos) modificado por atividades antrópicas. Fonte: Kitano (1969) apud Suguio (2006).


O papel dos microrganismos no ambiente aquático está fundamentalmente vinculado à transformação da matéria dentro do ciclo dos diversos elementos. Tais processos são realizados com o objetivo de fornecimento de energia para a sobrevivência dos microrganismos. Um dos processos mais significativos é a decomposição da matéria orgânica, realizada principalmente por bactérias. Esse processo é vital para o ambiente aquático, na medida em que a matéria orgânica é decomposta em substâncias mais simples pela ação das bactérias. Como produto final obtém-se compostos minerais inorgânicos, como, por exemplo, nitritos, nitratos, fosfatos e sulfatos que, por sua vez, são reassimilados por outros organismos aquáticos. O processo de decomposição, também designado como estabilização ou mineralização, é um exemplo do papel benéfico cumprido pelos microrganismos, o que vai contribuir na composição física e química das águas.

As águas subterrâneas, abastecidas pela precipitação, sejam do lençol freático como confinadas, também contribuem por percolação para fornecimento de águas para os rios. As águas subterrâneas são mais ricas em sais minerais que as águas superficiais. Ao percolar através do solo, absorvem ácidos carbônicos e ácidos orgânicos de matéria orgânica em decomposição, ao mesmo tempo em que se enriquecem de dióxido de carbono e de nitrogênio. A acidez, em grande parte devida ao dióxido carbônico dissolvido, aumenta a solubilidade de outras substâncias, principalmente minerais, donde provém o alto teor de matérias dissolvidas nas águas subterrâneas. O oxigênio presente antes da percolação é geralmente consumido na oxidação da matéria orgânica e na solução de carbonatos, resultando, para as águas subterrâneas, deficiência de oxigênio dissolvido. Este o motivo pelo quais certas substâncias insolúveis na presença de oxigênio são mantidas em solução em águas subterrâneas. As águas subterrâneas normalmente são límpidas, incolores, frescas e mais duras que as de superfície da mesma região.

Por outro lado alguns elementos podem ser adsorvidos ou absorvidos pelos minerais e, assim, removidos das águas fluviais; e até mesmo, o ciclo da água pode ser afetado por processos antrópicos e sua constituição química ser alterada.

As alterações ocorrem por mudanças nos ciclos biogeoquímico do carbono, do oxigênio, do nitrogênio, do fósforo, do nitrogênio, do cálcio, dos microrganismos, da água e outros, tendo como principal fator as atividades antrópicas, como, por exemplo, despejos de águas residuárias, lixo, esgoto sanitário e resíduo líquido industrial no ambiente, alterando a composição química, física e biológica das águas, contaminando e/ou poluindo os cursos d’água.

Depois que atinge o solo, às plantas e aos cursos d’água, as gotas d’água passam pelo processo de transpiração e evaporação, formando novamente as nuvens ao entrarem em contato com a atmosfera e afetadas pelo vento, a radiação solar e a temperatura. Quando ficam maiores e mais pesadas, caem novamente em forma de chuva, neve ou gelo, e assim reinicia o ciclo e, conforme o local, novas composições químicas, físicas e biológicas são adquiridas.

Referências:

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